Em entrevista, vice-presidente afirmou que Estado
deve ajudar a região
Publicado em 16/08/2020 - 08:21 Por Pedro Ivo de
Oliveira - Repórter da Agência Brasil - Brasília
O vice-presidente Hamilton Mourão é resoluto em sua
missão a frente do Conselho Nacional da Amazônia Legal: modernizar a
fiscalização, legalizar as atividades econômicas, impulsionar o crescimento
sustentável e desenvolver a região sem a exploração predatória - marca de
avanços civilizatórios desenfreados em outras regiões do planeta que deixou
cicatrizes.
Em entrevista ao programa Brasil em Pauta,
o general Mourão, que lidera os esforços do governo federal para dialogar,
preservar e apoiar a fiscalização ambiental no território amazônico, afirmou
que há uma preocupação genuína com o legado de preservação que será deixado
pela geração atual para os brasileiros do futuro. “O tema da sustentabilidade,
da preservação do meio ambiente, é um tema do século 21. A nossa geração tem
que ter a capacidade de manter os recursos naturais do planeta para que nossos
filhos e netos continuem a fazer uso desse bem, que é um bem comum a todos.”
As Forças Armadas, afirma Mourão, são uma
importante manifestação do Estado brasileiro em uma área vasta e de ecossistema
denso, difícil de ser integralmente coberta por qualquer tipo de serviço. “Um
dos grandes problemas da Amazônia é a ausência da presença do Estado. O Estado
brasileiro não se faz presente da forma que deveria ser. A única presença
estatal que temos lá, praticamente, são as Forças Armadas. Além da missão de
garantir as fronteiras, temos apoiado as agências que têm a responsabilidade de
fiscalização ambiental na região”, afirmou.
Para Mourão, a região amazônica - que compreende
60% de todo o território do país - necessita de atenção especial, tanto no
desenvolvimento econômico quanto em incentivos sociais de conscientização e de
regularização de atividades que podem ser consideradas predatórias e danosas ao
meio ambiente. Para tanto, agências regulatórias e fiscalizatórias da região
precisam ser resgatadas e remodeladas, de maneira a serem independentes do
suporte militar que atualmente é fornecido.
“A nossa visão, como gestores do Estado brasileiro,
é que as agências ambientais têm que passar por um processo de recuperação da
capacidade operacional. Nós [o governo federal] herdamos essas agências com
efetivo extremamente reduzido. Os instrumentos de trabalho precisam ser
modernizados”, ponderou.
Segundo Mourão, toda polêmica surgida em 2019 sobre
a alta do desmatamento e das queimadas na região poderá ser suprimida por
resultados positivos crescentes, que se propaguem através de um longo e
consistente plano de conservação e modernização da região. “Não podemos
prometer algo que não temos condições de cumprir. Nossa visão clara é que no
próximo ciclo de acompanhamento e monitoramento precisamos ter índices menores
de queimada e desmatamento dos anos anteriores. Há um planejamento estratégico
que sinaliza a médio e longo prazo o que deve ser feito na Amazônia”, afirmou.
“A Amazônia já tem uma área humanizada, onde houve
o encontro da população com a floresta. Temos que explorar essa região de forma
consciente, regenerar áreas que estão devastadas, ao mesmo tempo que aumentamos
a produtividade”, argumentou Mourão sobre uma forma racional de coexistência
entre os povos que vivem na região amazônica e as atividades comerciais.
Bioeconomia
Questionado sobre o modelo de negócios ideal para a
região, Mourão afirmou que acredita que o modelo “bioeconômico” - terminologia
usada para definir um mercado que tenha como base os recursos biológicos
recicláveis, renováveis e com consumo e exploração conscientes - seja a melhor
alternativa. “A Amazônia, por suas características, não é um lugar de produção
em escala. É local de produção sustentável, usando a riqueza da biodiversidade
existente. Temos que mapear cadeias de valor, melhorar a infraestrutura
logística sustentável - o aproveitamento das hidrovias, construção de pequenos
portos para escoar produção - e, óbvio, atrair a atenção do investimento
privado.”
Mourão afirmou ainda que solicitou recursos “a
fundo perdido” a grandes bancos que atuam na região para “a proteção e a
preservação da Amazônia”. “As grandes empresas são voltadas para a agenda
moderna do empresariado, a ESG (Environmental, Social and Governance, na sigla
em inglês). Conversei com grandes bancos que atuam na região e a ideia é que
eles adotem linhas de financiamento com juros melhores para atividades voltadas
à bioeconomia. E, claro, invistam, na medida do possível, na preservação
local”, concluiu.
Regularização fundiária
Para o vice-presidente, há um consenso geral sobre
regularizações fundiárias no estado do Amazonas. “É uma opinião unânime em
todos os diálogos com lideranças, mas parece que há uma barreira intransponível
para avançarmos no processo. Cerca de 500 mil famílias não tem o título da
terra que vivem há 30, 40 anos”, argumentou.
Mourão citou famílias que foram realocadas no
período de construção da hidrelétrica de Itaipu, localizada no Paraná, entre as
décadas de 70 e 80. Essas famílias, que viviam tradicionalmente na região que
hoje é a bacia da hidrelétrica paranaense, foram assentadas em regiões que
fazem parte da floresta amazônica sem nunca ter recebido o título das
propriedades para onde foram transferidas.
“Essas famílias não têm acesso a financiamentos e
nem assistência técnica rural. Isso causa uma exploração predatória nas
pequenas propriedades. O Estado brasileiro colocou essas pessoas lá e as
abandonou”, esclarece o vice-presidente. “Precisamos titular a terra para essas
pessoas, dar o registro em cartório e, a partir daí, eles entrarem efetivamente
no sistema capitalista”, disse.
Mourão citou ainda que imagens de satélite poderão
ser aliadas na regularização das propriedades. As imagens seriam comparadas com
a documentação disponível, e que o processo agilizaria 90% dos processos
existentes.
Agronegócio
Em relação ao agronegócio, o general Hamilton
Mourão tem uma visão estratégica sobre a influência da atividade econômica que
ainda é pequena na Região Norte. Ao tratar do assunto, foi enfático ao dizer
que “o agronegócio é um hard power no nosso país”. O conceito remete ao termo
sociológico que define um setor econômico ou político que tem o poder de
influenciar, ou “puxar”, outros setores da sociedade para a linha de frente do
debate e das políticas públicas.
“Não se pode falar de segurança alimentar no mundo,
hoje, sem que o Brasil esteja sentado à mesa. Alimentamos mais de 1/7 da
população mundial hoje. Isso dá mais de um bilhão de pessoas com comida
brasileira na mesa. Óbvio que isso traz concorrência para outros países. Temos
tecnologia, espaço vital, tudo em grande escala”. Mourão conclui que certos
grupos se aproveitam da dimensão do agronegócio brasileiro para conectá-lo
imediatamente ao desmatamento e às práticas predatórias, o que não é, em sua
opinião, verdade.
Imagem do Brasil no exterior
“Temos que fazer uso de um sistema de comunicação
social eficiente”, afirmou o presidente ao discutir a imagem do Brasil e a
defesa da floresta amazônica no exterior. Hamilton Mourão acredita que uma
campanha de conscientização com medidas visíveis, baseada na orientação atual
do governo, poderá reverter a imagem negativa que foi dada à gestão ambiental
da Amazônia em 2019, quando lideranças de outros países criticaram abertamente
a política ambiental brasileira.
“Em nenhum momento deixamos de reconhecer que
existem problemas ligados ao desmatamento, à queimadas, à exploração ilegal. É
responsabilidade do Estado brasileiro não deixar que isso aconteça”,
reiterou.
Fundo Amazônia
Autodeclarado defensor do teto de gastos, Mourão
afirmou que a medida é a “grande âncora fiscal que temos hoje”, e que não há
possibilidade de desrespeito à norma. Portanto, há uma discussão sobre o uso
das verbas do chamado Fundo Amazônia - uma iniciativa internacional para
financiar programas de preservação da floresta - na esfera federal. Mourão
acredita que a verba deve ser usada pelos estados, que podem concretizar
projetos benéficos tanto para o bioma quanto para a população que depende dele.
Exploração mineral
Sobre a possibilidade de viabilizar a exploração
mineral em terras indígenas de forma legal, Mourão se disse reticente sobre o
debate, que ainda não conta com apoio do Congresso Nacional. “A ilegalidade
beneficia determinados grupos. Devemos saber ter diálogo com o Congresso para
que o povo entenda a importância do assunto.”
“A Amazônia é a última fronteira inexplorada do
mundo. Fora a Antártica, temos a Amazônia. Mas a exploração tem que acontecer
dentro dos olhares do século 21. Temos que saber utilizar os recursos da
Amazônia de uma maneira racional. Há um amplo espectro de produção. E a
produção mineral também tem que ser feita de forma sustentável”,
argumentou.
Em uma possível legalização de atividades de
extração mineral em reservas indígenas - prática que já acontece há muitos
anos, mas de maneira ilegal, segundo o vice-presidente -, as comunidades seriam
beneficiadas, assim como o Estado, que recolheria divisas e poderia investir na
preservação consciente e sustentável das atividades econômicas.
"Uma vez que se conceda uma lavra de
determinado minério em uma terra indígena, a operação será feita dentro dos
parâmetros da legislação ambiental, de forma organizada. A etnia vai
receber royalties, o Estado vai recolher imposto. Teremos uma
atividade legal, e não as ilegalidades que prosperam hoje."
Maior fiscalização
Sobre o monitoramento de irregularidades em todo o
vasto território que compreende a floresta amazônica, Mourão afirmou que o
satélite que está sendo desenvolvido pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e
Inovações ajudará nos alertas de ocorrências que podem ser evitadas enquanto
acontecem, e não com o atraso de dias, semanas ou mesmo meses, como é o sistema
atual. “Não adianta eu saber que tem terras sendo queimadas ou devastadas
depois disso já ter acontecido. Teremos um satélite com tecnologia nossa. Teremos
um sistema de alerta diário, via radar. É importante ter essa conjugação de
esforços, e que esses dados estejam diariamente disponíveis para quem tem a
responsabilidade de impedir ilegalidades”, finalizou.
A entrevista do vice-presidente Hamilton Mourão vai
ao ar hoje, no programa Brasil em Pauta, às 19h30 na TV BrasilGov. A
entrevista também poderá ser assistida pelo canal da TV BrasilGov no YouTube.
Edição: Liliane Farias
Fonte: Agência Brasil
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